Em entrevista à Folha de S.Paulo, na segunda-feira (10), o filósofo norte-americano Daniel Dennett, afirmou que se declarar ateu hoje em algumas regiões dos Estados Unidos é o equivalente a se declarar homossexual nos anos de 1950. Pode ser. Mas nunca neste planeta o ateísmo esteve tão em voga, especialmente por meio de livros que chegam às listas dos mais vendidos, especialmente nos EUA. Caso de “Deus, um Delírio”, de Richard Dawkins - eleito recentemente um dos três intelectuais mais importantes do mundo – e Sam Harris (O fim da Fé – Religião, Terror e o Futuro da Razão), publicado em 2004. Ambos professam o desejo de acabar com toda crença religiosa.
É aceitável que nos grotões dos Estados Unidos a postura do ateísmo não seja aceita. Afinal, como observa o próprio Harris, mais da metade da população daquelas bandas acredita que o cosmo inteiro foi criado há apenas seis mil anos e 53% dos americanos são criacionistas, segundo o Instituto Gallup. Na condição de ateu, acho perfeita a visão de um mundo mais racional. OK. O problema é quando o ateísmo se transforma também numa religião. Sem fé, os não-crentes devem se apegar à Ciência e ao que ela alcança, com a preocupação de explicar “como” são as coisas e não quais os propósitos das coisas. Se é que eles existem. Muito menos partir para uma cruzada em cima dos crentes.
Sei que não dá para fundir religião e Ciência, por serem essencialmente incompatíveis, mas dentro do âmbito cientifico há mistérios tão espetaculares que alguns preceitos religiosos, como a reencarnação, podem estar escondidos em outras dimensões. Deus, a figura, não deve mesmo existir, mas sabe-se lá o que o universo nos reserva. A Ciência, portanto, também tem seu mistério. Só que, ao contrário da religião, não é para ser cultuado e aceito sem reservas e sem provas. O papel do cientista é desvendá-lo a cada dia.
Sem querer – e sem poder – entrar em complexidades da Física Quântica, posso especular que a tal Teoria das Cordas e suas onze dimensões são tão inimagináveis para as nossas mentes leigas e limitadas quanto a Santíssima Trindade. Só que muitos crentes acham que o mundo foi criado em sete dias e isso basta para eles até o Juízo Final. Para Ciência não basta. Nada é suficiente e continuará não sendo, pois provavelmente não existirá um momento em que tudo estará explicado.
Nada disso, porém, explica a imposição do ateísmo como solução final, “é isso e pronto”, como têm pregado alguns poucos sites-seitas (como não devia haver imposição religiosa, é claro). Devemos, por outra parte, considerar a imensa contribuição religiosa para o conhecimento humano, apesar das guerras e outras mazelas provocadas por preceitos católicos, judeus, muçulmanos etc. E que a Ciência, mesmo sem querer, entrou com sua parte nessa conflagração, com suas catapultas e bombas atômicas.
Por isso, achei legal quando uma atriz assumidamente atéia – se não engano a Camila Pitanga – recusou-se a posar de musa de um desses grupos que pregam aos quatro cantos a não-existência de Deus e que querem transformar esse conceito como pensamento único.
Como essa peroração tem tudo para se descaminhar para “viagem”, vou tentar um fecho agora.
1 – Não cabe juntar religião e Ciência num só quadrado. Cada uma na sua, mas em saudável convivência. Dentro do possível;
2 – É o pluralismo que dá graça à vida. Mesmo ateu, não imagino um mundo sem São Jorge, sem Buda e sem os Dez Mandamentos (pode ser chute, mas creio que todo nosso ordenamento jurídico vem de lá).
3 – Essencialmente tudo isso é uma questão de fé ou ausência de fé. Um defeito ou uma qualidade que vai depender da existência ou não de Deus. Pode ser que você não descubra isso nem morto. Pode ser que Ele exista, mas seja do segundo escalão, sem poder de veto sobre partículas elementares, por exemplo. Trata-se, então, de um problema que não tem importância prática no cotidiano.
4 – A cada dia a Ciência vai mostrar coisas novas – como o acelerador de partículas -, mas vai ficar sempre em dívida. Sempre ficará faltando uma peça do quebra-cabeça – e talvez existam trilhões de quebra-cabeças;
4 – O debate é bom, a conversa é boa, mas quando o objetivo é a conversão do outro, aqui e agora, tudo vira uma chatice. A pessoa forma suas convicções ao longo da vida. Alguém pode convencê-lo a comprar determinado produto, mas não vai torná-lo católico ou ateu de uma hora para outra.
_lulafalcao
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2 comentários:
eu sou ateu graças a deus !
caramba! arrasou, seu lula! muito boa argumentação! vou espalhar! abs
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