O livro dele termina como uma ata de reunião. Tudo estava lá. Descrição minuciosa e demonstração de excelente memória. Anos e anos assentados no papel e mais tarde na tela do computador. Vida política agitada, detalhes, conversas, algumas revelações. Entra nesse emaranhado uma frase de Tocqueville, uma observação aguda de Tancredo Neves ou manchete do Correio da Manhã.
Não era o livro que ele queria ter escrito. O velho político sonhava com um romance de idéias e não com aquele amontoado de notícias e mentiras que ele protagonizou em 60 anos de carreira. Como vereador, deputado, ministro e mais tarde candidato derrotado a Presidência da República. Não havia emoção nem uma linha mestra percorrendo a história ou comentários bem postos capazes de se dissolver no texto e formar um caldo elegante.
Não era, enfim, memórias em forma de romance. Ele pensou: toda uma vida política para, no final das contas, não desaguar numa obra prima. O jeito seria começar de novo. Mais dois anos de trabalho. Só que não havia tempo. Os médicos foram taxativos: seis meses, no máximo.
@-lulafalcao
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