quarta-feira, 23 de março de 2011

Rebotalhos


No início deste ano, lancei o livro “Todo dia me Atiro do Térreo”. Alguns trechos ficaram ruins ou não se encaixavam no encadeamento da história. Nem no blog entraram. Aos poucos, vou soltar os refugos da #tuiteira. Apenas para não deixar este espaço vazio. Segue, junto com as desculpas do autor:



@ Nem venha dizer “você não segura a onda do mundo hostil lá fora, minha filha”, porque eu não vou acreditar. Quer mundo mais hostil do que esta casa? Até meu quarto é um lugar perigoso. É lá que eu penso e só penso besteira. Quantas vezes esse negócio de matar a família não me passou pela cabeça? Você e meu pai são uns trastes, vivem resmungando pelos cantos, um contra o outro e os dois contra mim. Pra vocês, não faço nada que preste e meu pai tem sempre que entrar em cena para dizer que aquilo não foi nada, pois em 1959 ele fez muito melhor e em condições bem piores. Tudo foi mais bacana no passado, nada presta hoje em dia, inclusive computadores, porque vocês são ranzinzas ordinários que não se contentam em combater a juventude dos filhos e a juventude em geral e parte para esculhambar todo que é moderno. Então, vão pro anos 50, com suas geladeiras de querosene, carros poluidores, TV em preto e branco cheia de chuvisquinhos, papas de maisena, paralisia infantil e outras merdas. Vão se fuder. Eu não fico nem mais um minuto nesta porcaria de casa.
@ Foi mais uma discussão com minha mãe depois da segunda volta à casa dos pais. Sabe como é. A crise apertou para todo mundo e não foi só pra mim. Veja os Estados Unidos em petição de miséria. Resumindo: voltei e voltei para ficar por muito tempo.
@ Apesar dos pequenos entreveros domésticos, família tem sempre um lado de carinho, apoio, conforto. Embora isso seja raro aqui, existe. Meu único medo é que um dia aconteça uma cena que já me apareceu em sonhos: minha mãe, que deverá viver uns 200 anos, trocando minhas fraldas pela segunda vez na vida. Só que as fraldas nos sonhos, são geriátricas.
@ Não tenho jeito para filha pródiga – nem meus pais querem isso. Eles querem notícias dos filhos – boas, de preferência – e não um encosto diário cheio de manias: eu. Mas procuro me preservar. Tranco o quarto. Já bati alguns recordes de permanência no quarto quando morava sozinha. É moleza. Leve um bom estoque de biscoitos, duas garrafas de vodka, uma cartela de rivotril e maconha a gosto. Dá para uma semana.
@ Uma TV ajuda. Já me especializei nas falas de toda a série Bourne, que é repetida no canal a cabo como uma missa. Tem todo dia, várias vezes (pelo menos era assim em 2010). Mesmo assim é legal porque uma hora o cara está em Paris, noutra aparece em Moscou, daqui a pouco desembarca nas Bahamas. Doidona, viajo junto. Só que o Matt Demom está fugindo da CIA; eu estou fugindo de mim.

PS: em abril o livro será lançado no Rio. Aviso.

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