Ele foi ao bar beber com moderação. Com moderação, tomou a primeira, a segunda, a terceira. Moderadamente, pediu a quarta, a quinta, a sexta. Cada vez mais moderado, encheu a cara.
Sim, existe o bêbado moderado. Quando mais bebe, mais moderado fica. Aos poucos, enquanto os outros se exaltam, ele perde a estridência, busca o acordo, tenta apaziguar os ânimos. Com sucessivos e moderados goles, ele fala para dentro, quase ninguém entende, mas está sempre batendo nas costas do interlocutor, pedindo calma e bom senso.
O bebedor moderado já é um alcoólatra moderado há uma mais de duas décadas. Bebe moderadamente como poucos. Sua predisposição ao diálogo, no entanto, nunca é abalada pelo álcool. Pelo contrário. Ele está ali para evitar conflitos, mediar desentendimentos, sugerir saídas. Diante de posições exaltadas, tenta encontrar uma terceira via, um ponto em comum, uma solução satisfatória e, obviamente, moderada.
Suas intervenções mais comuns: “não foi assim tão grave”, “ela não quis dizer isso”, “vamos parar com essa história”, “foi sem querer”, “essas coisas acontecem” e, mais importante, nunca se cansa de pedir moderação aos amigos que, segundo sua visão turvada, estão bebendo sem método. A lógica é simples: bebida é uma coisa; moderação é outra. As duas podem se encontrar exemplarmente quando se fica embriagado. Nessas horas, ele não para. Continua a beber de forma ainda mais moderada, entre a ponderação e a aquiescência.
Só para ele, o conselho dos rótulos – “beba com Moderação” – parece ter algum sentido e nenhuma hipocrisia.
@_lulafalcao
sábado, 30 de abril de 2011
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2 comentários:
Achei fantástica sua análise; feita de uma forma meio conto, meio crônica... Tão genial a sua visão, a forma como " destilou" sua observação... A verdade é a seguinte: esse seu texto dispensa comentário, rótulo, ou qualquer hipocria do tipo. Achei perfeito! Me desculpe a falta de moderação nos elogios! :)) Abração!
Abração, Elaine.
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