domingo, 4 de março de 2012

Maconha

Quero ver quem vai garantir o meu de hoje. Quero ficar na cara, não, visse. Não é assim que dizem na minha terra? Visse. Serve pra tudo: pergunta, resposta, ameaça, etc. Te cuida, visse. Mas não era disso q’eu estava falando; é sobre passar o dia sem uma presença, pelo menos uns tapas, porque a pessoa não pode viver sóbria o tempo todo e é isso a causa de muitas doenças, pois ficar sem maconha significa que você (eu, no caso) será envolvido por preocupações e problemas, seguindo daí uma série de coisas que encaminham o sujeito para uma velhice das piores ou mata ainda cedo, de ataque cardíaco ou qualquer merda dessas. Voltando, pois, ao assunto principal: onde vou arranjar fumo?

Hoje tem duas possibilidades. Primeiro é a casa de Lurdinha, mas ela anda tão amarga, e chegar assim de repente, só com o objetivo de fazer a cabeça, fica deselegante demais, negócio de maloqueiro da pior espécie, e eu acho que não vou fazer isso, não. O plano B é uma festa de jovens subjetivos, moças bonitas, nenhum playboy, quadrinhos pornográficos, conversas sobre o fim do capitalismo, todo mundo contra qualquer censura na Internet; enfim, gente boa. Vou nessa festa. Conheço a menina que vai botar som e dois produtores de cinema, além de uma enorme gama de produtores de outras artes, especialmente teatro, literatura e eventos governamentais da área de cultura. Tem também gente que gosta de circo e anarquistas.

Neste ponto, salvo engano, já estou na festa. Nunca sei quando é “neste” ou “nesse”, mas isso é outra história. O número do lugar confere, é aqui. Está animada, com repertório entre Zeca Pagodinho e Arvo Pärt, passando por quase todos os gêneros para não deixar ninguém insatisfeito ou porque eles são assim mesmo, ecléticos. Posso dizer que me deixam à vontade, entro num grupo, saio pra outro, até chegar numa rodinha, esperar a minha vez, não ser fominha, rodar na paulista, porque tem muita gente aqui a fim de fumar. O principal, então, aconteceu. Estou levemente alterado, mais descansado, pensando uns absurdos bons, mas me deu agora certa agonia. Vou sair à francesa, pegar um táxi, embora a festa esteja ótima, especialmente para quem está dançando, mas o problema é que eu não danço, fico só olhando, e quando passa o efeito do fumo, ou mesmo no meio, eu quero sair. Não é paranóia, é falta de jeito para ambientes dançantes.

Antes de todo mundo cair na pista ainda dava. Foi nessa hora que um amigo explicou como será dará o fim do capitalismo. Ele também tinha fumado, é claro, mas foi uma conversa interessante, cheia de dados, declarações de economistas; o rapaz conhecia tudo e então resolvi não argumentar contra, mesmo porque eu não tenho nada a perder com o socialismo, ressaltando-se essa história de não pode isso, não pode aquilo, que também acontece na direita; é uma discussão longa, e resolvi encerrar o assunto com o tradicional “pois é...”

O certo é que volto para casa. Já estou em casa. O meu espírito não fracassou, eis a verdade. Pensei em pedir uma presença daquela moça dos malabares, mas ela tinha tão pouquinho. Fui correto. Mas sempre tem o outro lado: estou careta de novo. Queria um pra ver um filme e depois dormir. Começo a vasculhar a casa e quem esperava uma daquelas agônicas procuras, com final infeliz, se estrepou. Vou usar “eis” de novo. Eis que surge, diante dos meus olhos, sua excelência, a baga. Uma baga de bom tamanho, esquecida talvez de propósito. Sou do tipo que perde uma baga aqui e ali só para ter o prazer de encontrá-la por acaso ou numa procura desesperada.

O filme começou e sinceramente não estou entendendo. O pior é que se trata de um filme simples, sem maiores elucubrações, mas tenho a mania de tentar remontar o roteiro à minha moda, complicando situações, como o ato de tirar o carro da garagem. O cara já pensa em Road-movie. O ator sai da garagem rumo ao desconhecido, não quer existir mais, meio Passageiro - Profissão Repórter, mas não ficaria por ai, a paisagem seria o deserto e um bom discurso sobre a cultura norte-americana do século 20 daria conta do resto. Mas o miserável pega o carro apenas para ir ao supermercado e depois, pior, volta e estaciona o carro novamente. Rola depois um almoço em família e perguntas do tipo “como vai na escola?” ao filho cabisbaixo. Não entendi e mudei de canal.

Mas há uma programação feita sob medida para maconheiros: os especiais sobre o universo. Como tudo começou? O big Bang, os buracos negros, as galáxias e as possibilidades de um asteróide atingir a terra no fim do ano. Esses programas normalmente terminam sem acontecer nada, uma vez que o narrador tranquiliza a todos, depois de ter criado o maior pânico, mostrando aquele pedregulho batendo no meio dos Estados Unidos. Até hoje não sei a razão dessa preferência de alienígenas e asteróides pelos Estados Unidos. Mas isso é outra história. É a segunda vez que digo “isso é outra história”, mas não tem importância, os melhores escritores americanos do Norte repetem uma palavra não sei quantas vezes e foda-se. Queria dizer que as Imagens do asteróide e da terra são feitas no computador e mesmo assim uma amiga minha já sentiu um baque pros lados da Jaraguá quando o Planeta virou em pedaços. Isso não interessa muito a quem está acostumado a ver essas TVs de Ciência, nem se assusta mais, porque no final eles vão dizer que todo aquilo que disseram era mentira. O que vale é o mistério. Ai você fica viajando nas mais espetaculares teorias, que não são espetaculares nem teoria, mas naquela hora funcionam, é uma beleza. Então você esquece tudo, fica ali navegando entre as estrelas, come banana com leite Moça, e depois dorme.

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