Então, o momento atual remete ao momento
seguinte, antes de ser absorvido por inteiro agora, valendo esta ansiosa agonia
para fatos mais relevantes - amor, vida e morte. Apaixonado, previne-se contra
a separação iminente, no emprego faz planos para a demissão a qualquer hora e
mesmo fisicamente sadio vive sobressaltado pelo fim. Espera por copas do mundo,
carnavais e verões e sente-se contrariado por não achar nada demais quando o grande
dia chega. Só tem pensamentos para situações seguintes, e eis o futuro
atrapalhando o presente e o passado.
Está carregando o que virá em sua história,
enquanto tenta explicar como funciona o que sente, quase sem prazer, embora a
atividade da escrita seja a única em que
se detém e presta atenção, livre da ansiedade. É um caso clínico e existencial e também um
caso literário. Seus textos começam por impulso, sem nada na cabeça, e ele
espera que surja do nada na cabeça um pedaço de ideia, sobre si ou outros, e o
passo seguinte é dispor esse pensamento em comparação com alguma coisa real, as
condições do tempo ou uma mulher, por exemplo, e em seguida envolve tudo numa
situação, num cenário, e dá voz aos personagens, descreve o ambiente, mas não
perde tempo com muito paisagismo, pois chateia o leitor.
Normalmente os personagens caminham em
direção a um final já planejado, correm sobre um roteiro, seguem um destino.
Não é o caso dele. O texto só terá o momento presente. Amanhã pode ser
diferente – outro rumo, outra prosa - e ele e seus fantasmas não têm um mapa. Só
a estremeção inicial, transformada aos poucos em conceito, num jeito de encaixar
as palavras ou numa confusão sem pé nem cabeça. Ele acumulou influência a ermo,
sem método, deu nisso, mas segue adiante.
Ocorre então um problema, há personagens
vagando na periferia da história, sem motivo, sem o atalho para entrar no
enredo e ele tem certeza que eles devem entrar, não sabe por onde e quando, se
no próximo parágrafo, daqui a dez páginas, sentirá um prenúncio. Evita provocar
um encontro casual, no meio da rua, entre o pivô do enredo e o coadjuvante,
vivente noutro enredo, de segunda classe. Arruma uma junção verossímil ou
fantástica, contanto que seja metricamente interessante, com ritmo e ironia, se
for o caso. Divaga. Era bom que assim fosse assim na vida real.
Se não consegue, tenta de novo, espera um
impulso, apela aos seres rastejantes de Dostoievski e de todos os doentes da
literatura. Há um imenso vazio a ser preenchido e ele vai com calma, toda calma
que falta ao curso de seu dia.
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