Para ele toda viagem guardava uma decepção
– a chegada. A emoção estava na véspera, na permanência nos aeroportos e no
período do voo. Tudo acabava no desembarque, onde não havia mais nuvens; apenas
bagagens rolando na esteira e passageiros apressados.
A viagem começava quando ele comprava a
passagem. Gostava dessa observação do escritor Gabriel Garcia Marques. A partir
do bilhete na mão, iniciava-se a alegre ansiedade, desde o planejamento
minucioso do itinerário e conexões – quanto mais escalas melhor - à arrumação
da mala. Dúvidas boas e freqüentes sobre que livro combinava com um saguão
lotado e um céu de brigadeiro.
Adorava aeroportos. Garantia que as
mulheres eram mais bonitas nos aeroportos, especialmente as passageiras de
shortinhos rumo a lugares ensolarados. “Essas vão para Noronha”, dizia baixinho
quando deparava com um grupo acima do padrão, com alcinhas de biquíni sob incipientes
blusinhas brancas. No deck, outro
espetáculo – o sobe e desce dos aviões, enquanto lia jornais e tomava café. Então
voltava ao segundo andar e estava mais uma vez diante da variedade de gente a
ser embarcada. Talvez alguém daquela paisagem humana, mudando a cada lote de
voos, também pensasse como ele e achasse a voz sensual de Iris Lettieri, anunciando
partidas e chegadas, um dos grandes momentos da vida.
Na ala internacional, a intensa mistura de
vozes estrangeiras. Suecas e nigerianas numa mesma fila, e ainda por cima
lindas, em que outro lugar ele encontraria? Dirigia-se às moças, num inglês
precário, pedindo informações desnecessárias, só para ouvi-las falar e ver
olhos brilhando de intensa expectativa.
Usufruía ainda mais o aeroporto quando Iris
anunciava o atraso de seu voo. Para muitos seria uma contrariedade. Não para
ele. Mais tempo para observar a fauna humana, aeromoças apressadinhas
arrastando suas malas padronizadas, comandantes altivos e despedidas de cinema.
Depois, o voo em si. A bordo poderia pensar
na vida, anotar ideias, ver um filme, ouvir a conversa dos vizinhos, ler a
revista de bordo sob o senso spinoziano, ou seja, um milhão de possibilidade a
nove mil pés de altura. Como não imaginar quem estava lá embaixo, na região
rural de Uberaba, por exemplo, era outra diversão e por isso sempre viajava na
janela. Olhava para terra, o mapa gigante, ruazinhas, e de repente um arco-íris,
uma tempestade, outro pequeno avião passando ao lado. Gostava, enfim de tudo.
Gostava até mesmo das turbulências.
Por fim o pouso triste, a inexplicável
pressa das pessoas em sair do avião, a espera das malas e logo o taxi seguiria pelas
ruas da cidade, mostrando que ao rés do chão tudo perdia importância.
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