Quando
era criança ouvia o pai repreender a mãe por procurar cabelo em
ovo. Ele ficava torcendo para ela achar, pois nesse tempo ainda não
era versado em expressões idiomáticas e não via nada demais em um
ovo ter cabelo. Afinal, a pequena estrutura já era esplêndida por
natureza, inteiramente fechada e branca, num arredondamento perfeito,
sem sinais de entrada, mesmo secreta, impossível, por exemplo, de
ser aberta como se abre hoje um kinder ovo. O cabelo seria mero
ornamento externo, igual às perucas coloridas do carnaval. Não
havia uma marca, uma divisão, uma área desatarraxável, uma saída
ao estilo do cubo mágico, geometricamente favorecido por seu formato
quadrado. Para se chegar à clara e à gema, apenas uma solução
deselegante: quebrar a casca, de preferência contra a borda da
frigideira. Depois, o conteúdo do ovo era frito e comido, sem a
menor reflexão sobre a falta de suavidade e estilo.
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