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- Na adolescência eu costumava escrever
cartas de suicida apenas por diversão e treino para virar escritor. Levava
o ofício a sério, a ponto de considerar tais despedidas um gênero
literário - tão importante quanto o romance e o conto. A vantagem era não
precisar morrer por essas linhas de falsas infelicidades, sofrimentos
inventados e culpados sem culpa. Assim, vingava-me da falta de sentido da
vida que, à época, parecia cheia de sentido e alumbramento. Era o tempo do
existencialismo e eu não queria ficar por fora. Durante anos, criei toda
sorte de razões para dar cabo à vida: doenças sem cura, desilusões
amorosas, dívidas impagáveis e revolta contra a opressão doméstica. Mais
tarde, quando me tornei escritor de médio alcance, torturas existenciais
passaram a me atormentar de verdade. Mas aí as cartas de suicida tinham
perdido a graça. Até elas.
- Escrevo todos os dias. É um vício. Às
vezes só um parágrafo, às vezes cinco páginas. A maioria dos textos vai
para uma pasta, chamada purgatório, mas pouca coisa se aproveita por
inteiro, rende mais como peças de reposição. Pode estar lá, por exemplo,
uma frase para outra história, pedaços de falas e outras tralhas. Um
trecho de diálogo pode servir para um viajante, uma velha solitária ou um
político derrotado.
- Enrolado à perfeição como cigarro de
fábrica. Carburação exata, queimando devagar e fornecendo muito. Bastou a
metade. Tudo funciona bem e não precisamos mais sacrificar nossas vidas em
dúvidas e desilusões.
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