Tanta
ansiedade nesses dias de sua ausência, Adélia, nem você imagina. Aliás,
imagina. Basta pensar em minha agonia elevada a uma potência cósmica, andando
de lá e para cá dentro de casa, cada vez mais rápido, tentando encurtar o tempo
que resta para sua volta. Pensei que faltava uma semana; faltam duas. Pensei
que iria suportar; está difícil. Às vezes ouço sua voz, mas é a TV. Às vezes ouço
seus passos na sala; é a imaginação ansiosa e transtornada.
Os
remédios para dormir não fazem mais efeito e quando fazem, só um pouco,
desfazem o sono quando estiro a mão para o lado esquerdo da cama e você não está
comigo. Sempre fui assim, qualquer espera me consome, você sabe, mas agora
estou tomado por movimentos involuntários. Enquanto penso em você, o corpo
realiza operações desnecessárias e obsessivas. Outro dia me descobri na esquina
sem notar que tinha saído de casa.
Tento reduzir o tamanho dos dias. Só que eles parecem mais longos.
Sua
primeira viagem a negócios. Bom para você, péssimo para mim. Mas não quero
atrapalhar, embora não consiga deixar de pensar em você em todos os momentos,
num sentimento indeterminado entre saudade e desespero. Falar nisso estive duas
vezes no hospital, emergência, pensei que ia morrer. Perdi o mundo de vista, me
vi encaixotado e depois apaguei. Os médicos passaram mais remédios para reduzir
a ansiedade e o pânico.
Para
você preocupar-se é mais uma preocupação, tudo parece OK. Desculpe-me, então,
por insistir nesses termos, mas é uma maneira de passar o tempo até a sua
volta. Ando confuso e por isso confiro esse mal-estar à sua ausência e pode não
ser isso. Vivo em pensamentos tolos, remoendo coisas antigos, como por exemplo
o dia em que me vi sem Deus e perguntei e agora, o que será de mim?
Eu
sei, nada disso perturba seu jeito de encarar o mundo, sem dramas, sem os
fantasmas inexistentes que enfrento dia e noite, numa guerra constante em que já
perdi a maioria das batalhas. É o que mais admiro em você - ser diferente de
mim em quase todos os aspectos.
Como
estou escrevendo agora, sujeito a mudanças de opinião, deixo aqui também uma dúvida:
caso você seja a causa do meu desespero por que devo esperá-la com tanta ganância?
Não seria melhor esquece-la? Você é a causa ou conseqüência do meu drama? Enfim,
posso estar apenas doente, sendo a paixão
um sintoma, que pode combatido com medicamentos e álcool. O problema é o
que provoca tudo isso. Talvez não seja você, e caso seja não seria aconselhável trazer para perto alguém
cuja ausência detona tanto desordenamento.
Pensando
bem, Adélia, acho melhor você não voltar
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