domingo, 12 de julho de 2015

O homem sem sentido


O homem sem sentido rabiscava letras e sinais sem sentido para dar trabalho aos historiadores e arqueólogos. Gravava em pedra, com tinta resistente ao tempo, marcas sem pé nem cabeça, bichos inexistentes, objetos desconcertantes e inúteis e frases nunca ditas por personagens imaginários e improváveis. Fez disso a sua vida, apesar dos remédios para impulsos não desejáveis e da perplexidade dos parentes.

Não veria seus descentes às voltas com o mistério nem mesmo saberia se sua mensagem chegaria intacta e legível até ser encontrada milênios à frente. O homem sem sentido queria apenas imaginar diversos cenários sobre sua iniciativa pioneira, entre a arte e a loucura. Mas o futuro lhe reservou uma surpresa – haveria alguém para decifrá-lo lá adiante no tempo e uma lógica enfim caberia em sua deliberada falta de lógica.

O homem sem sentido está morto há eras e agora estudam suas peças em institutos especializados, academias reais e museus antropológicos. A tese predominante, quase uma certeza entre paleontólogos, é que os códigos primitivos e engenhosos do homem sem sentido indicavam uma cadeia de acontecimentos responsável pela que somos hoje. Ponto a ponto explicado, peças encaixadas, datações confirmadas por radio carbono. 

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