Para os crentes, o céu é o limite. O dono
do céu, no entanto, pensa diferente. Em sua infinita sabedoria e curiosidade,
Deus quer saber o que veio antes dele e o que virá depois. Conhece a
circunscrição de seus conhecimentos, mas sabe que é produto daquela explosão
primordial. O que ficou para trás desse episódio é um mistério que intriga o
Todo Poderoso em seu Paraíso sempre repleto de almas e dúvidas.
Chegar lá envolve pouca logística - basta
estar morto - e alguma incerteza. As chances são de três para um (céu,
purgatório, inferno). Portando, não é a ausência de pecado que leva os humanos
mortos para o céu; é o acaso.
O céu não é propriamente um lugar. É uma
situação. Ao contrário do inferno, não dispõe de paisagens. Tudo é etéreo
demais para ser descrito. Flui como um rio de névoa, embora a comparação não
seja exata e escape às ciências terrenas. Existe, porém, interações de
pensamentos num nível muito fraco. Deus conversa com os seus abrigados por
ondas muito fracas, tão fracas que seus receptores as confundem com
interferências. Mas Deus olha partes mais distantes do Universo. Suas lentes
gravitacionais são o que o chamávamos de “óculos fundos de garrafa” antes da invenção
da alta dioptria.
Deus e seu estado são uma coisa. O mundo
dos abrigados nesse colosso indefinido é outra. Depende da crença de cada um,
da capacidade de imaginar seu paraíso de modo a reproduzir, com a intensa
sensação da verdade, todos os detalhes dos seus respectivos livros sagrados.
Todos monoteístas. O católico, por exemplo, viverá sua experiência eterna na
matrix santificada do modo como aprendeu no catecismo e terá todas as
experiências apropriadas ao modelo cristão. Pode até encontrar São Pedro na
porta, com as chaves dos apartamentos, ou Nossa senhora circulando por ai,
seguida por anjinhos. É uma ilusão, mas o que não é? A vida também foi?
Espíritas caem em outra terra, igualzinha a
essa, mas com pequenas diferenças, que eles nem notam. Alguns sequer sabem se
morreram. Os ateus, casos à parte, acham que estão sonhando e como não acordam
nunca – acordam, mas em sonhos – continuam certos de que não há vida após a
morte.
Mesmo nessa condição, os mortos ali vivos não têm a certeza de que há um Deus. Mantém a fé como mantinham em vida e levam tudo como se fosse uma etapa, pois não têm contato direto como o Todo Poderoso que, em seu reino, não se sente tão poderoso assim.
Deus
tem ciência dessa cadeia de eventos – ciência pura -, mas tem dúvidas sobre o
monoteísmo como principio e fim. Pensa, às vezes, na existência de outros
paraísos, num poder compartilhado entre divindades a não sei quantos anos-luz
de sua paróquia. Estudou bem o caso da índia e de suas 330 milhões de
divindades, e acha estranho não ter indianos entre seus hóspedes - uma matéria
escura a desafiar suas especulações diárias. Pensa ainda que ele próprio é uma
peça da engrenagem e que jamais será possível criar uma teoria de tudo, mesmo
com a eternidade á disposição.
S